Ação Penal Pública - Classe 31
Processo nº 0000507-58.2007.4.05.8400
Autor: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
Réu: TARCÍSIO ARAÚJO DE MEDEIROS
S E N T E N Ç A
E M E N T A: PENAL E PROCESSUAL PENAL. CRIME DE RESPONSABILIDADE DE PREFEITO. USO DE DA UNIÃO PARA FINS DE PRESTAÇÃO DE CONTAS. CARACTERIZAÇÃO DO DELITO PREVISTO NO ART. 1º, INCISO III, DO DECRETO-LEI Nº 201/67, EM CONCURSO MATERIAL COM O ART. 304 DO CÓDIGO PENAL. CONDENAÇÃO. PROCEDÊNCIA PARCIAL DA PRETENSÃO ACUSATÓRIA.
1. Uma vez deme trabalho especificado, configura-se a conduta típica de desvio, definida no art. 1º, inciso III, do Decreto-Lei nº 201/67, pelo então prefeito, gestor do município e do convênio.
2. O tipo penal estampado no art. 1º, III, do Decreto-Lei nº 201/67 visa t inciso I do mesmo dispositivo, caracteriza-se independentemente do objetivo de lucro, afigurando-se estranha ao tipo penal a inquirição da moralidade do fim.
3. A prática descrita no art. 1º, inciso IV, do Decreto-Lei nº 201/67 consiste em "empregar subvue eles estão vinculados.
4. Empregadas as verbas na construção de unidades habitacionais, tal qual consignado nas rubricas, não merece prosperar a pretensão acusatória com lustre no inciso IV, art. 1º, do Decreto-Lei nº 201/67.
5. Comprovado que o réu adeve ser a cominada no art. 297 do Código Penal.
6. Procedência parcial da pretensão acusatória.
Vistos etc.
I - RELATÓRIO
Trata-se de ação penal proposta pelo MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL em desfavor de TA1º, incisos III e IV, do Decreto-Lei nº 201/67 (crime de responsabilidade de prefeito).
Consoante narrativa do Parquet federal, a Prefeitura Municipal de Japi/RN, na gestão do denunciado, que perdurou de 1997 a 2000, firmou o convênio nº 176/2ntos e quarenta e quatro reais e trinta e seis centavos) como contrapartida do município.
Afirma o órgão ministerial que, após realizada Tomada de Contas Especial (processo n° 59000.001864/2000-08), irregularidades foram identificadas na execucumentos juntados pelo acusado ao processo administrativo que tramitou no Tribunal de Contas da União é falsa, especificamente o termo de contrato de prestação de serviços firmado entre a Prefeitura Municipal de Japi/RN e a empresa Diniz e Silva LTDA., e ne a assinatura aposta no contrato como sendo do Sr. Jorge Luiz Diniz não emanou de seu punho.
Outrossim, é relatado na denúncia que, em declarações prestadas nos autos do IPL 084/2005, Jorge Luiz Diniz alegou não conhecer o réu e tampouco havert. 1º, incisos III e IV, do Decreto-Lei nº 201/67.
Para fazer prova dos fatos articulados na peça inaugural, a acusação arrolou a testemunha JORGE LUIZ DINIZ (fl. 06).
Informações de antecedentes criminais do denunciado à fl. 08.prefeito constitucional de Japi/RN.
Decisão de fls. 62/64 deferiu o pedido formulado pelo denunciado, reconhecendo a incompetência arguida, bem como determinando a remessa dos autos ao TRF da 5ª Região.
Por meio de promoção minist A denúncia foi recebida pelo TRF da 5ª Região em 29 de outubro de 2008, por meio do acórdão de fl. 115.
Em atenção à nova promoção ministerial (fls. 119/119v.), porque findo o mandato do réu, os autos foram novamente remetidos a est17 de julho de 2009 (fl. 140) determinou a citação do réu, ao tempo em que confirmou o recebimento da denúncia.
O acusado apresentou defesa escrita às fls. 144/145, e apresentou rol de testemunhas (fl. 145).
As testemunhas arroladRequerida a dispensa da oitiva da testemunha MANOEL SOARES DE LIMA.
Em audiência de instrução e julgamento realizada em 06 de maio de 2010 (fls. 180/181), foi inquirida a testemunha arrolada pelo MPF, assim como interrogado o réu. Juntada cópria dos fatos descritos na denúncia restaram comprovadas na instrução criminal, razão pela qual reiterou o pedido de condenação do acusado nos mesmos termos da denúncia.
O réu TARCÍSIO ARAÚJO DE MEDEIROS apresentou alegações finais às fls. 196nado a administração do município de Japi/RN, a qual havia sido confiada a terceiros. Requer ainda que, em caso de eventual procedência da pretensão punitiva, seja considerada a continência entre os tipos estampados nos incisos III e IV do Decreto-Lei nº postulou a condenação do acusado TARCÍSIO ARAÚJO DE MEDEIROS nas sanções previstas no art. 1º, incisos III e IV, do Decreto-Lei nº 201/67 e no art. 304 do Código Penal.
II. 1 - Dos ilícitos de desvio de verbas públicas e de emprego dos recursos em desaado a administração do Município de Japi/RN a terceiros, não pode ser responsabilizado por eventuais irregularidades na execução do convênio em debate.
É de se frisar que não há provas nos autos, à exceção de suas próprias alegações, de que o e demonstra a fragilidade do alegado.
Outrossim, acaso provada a veracidade dos fatos afirmados - o que ensejaria outras providências -, uma vez que o referido afastamento teria sido levado a efeito ao arrepio da lei e considerando que seus su o abandono do cargo de modo descerimonioso, além de constituir grave agressão à moralidade que deve nortear a Administração, também sob uma ótica puramente legal, não se revela capaz de elidir a sua responsabilidade.
Feitas essas consideraçõde 17 (dezessete) casas de taipa e sua posterior reconstrução em alvenaria.
Afirma o Ministério Público Federal, na peça acusatória, que embora os valores relativos ao convênio tenham sido repassados integralmente ao citado município, a execuç De fato, com o remate do mencionado exame, procedido através de inspeção in loco nas unidades habitacionais objeto do convênio, constatou-se que houve "inexecução total ou parcial dos serviços dispostos nas Tabelas de B1 a B17 em anexo [ao laudo]", no asseguram que, em que pese passados 05 (cinco) anos entre a entrega das casas pela Prefeitura e a vistoria realizada, os serviços apontados nas tabelas B1 a B17 jamais foram executados - parcial ou totalmente - não se podendo dizer que foram mascarados pouas dimensões.
Noutro passo, as fotografias anexas ao inquérito (fls. 14/61) ilustram as irregularidades referidas, tais quais a inexistência de fossa sanitária em algumas casas e a ausência de banheiro no interior de outras. Inobstante, o prólecido anteriormente, vislumbra-se que o acusado, como responsável, à época, pela administração do Município de Japi/RN, conferiu uma aplicação irregular às verbas federais repassadas.
Desse modo, os fatos descritos na denúncia enquadram-se noalizando aqueles que deixam de aplicar rendas ou verbas públicas em conformidade com a destinação prévia que lhes é determinada. Por essa razão, diferentemente do que dispõe o inciso I do mesmo dispositivo, caracteriza-se independentemente de que o agente "empregar subvenções, auxílios, empréstimos ou recursos de qualquer natureza, em desacordo com os planos ou programas a que se destinam". Desta feita, o tipo penal contempla a hipótese em que o prefeito emprega recursos públicos de qualquer natureza em dviam sido destinadas, tal qual consignado nas rubricas. O desvio de finalidade tutelado pelo legislador há de ser entendido de forma mais ampla, não se podendo confundir os "planos" ou "programas" a que se refere o texto legal com projetos mais específicosse nos pormenores de projetos de trabalho e assim pretender uma condenação à sanção capitulada no inciso IV do art 1º do Decreto-Lei nº 201/67.2.
Pelas razões ora esposadas, aliadas aos elementos constantes dos autos, é de se concluir que o actação falsa nos autos de processo administrativo que tramitou no Tribunal de Contas da União, especificamente o termo de contrato de prestação de serviços firmado entre a Prefeitura Municipal de Japi/RN e a empresa Diniz e Silva LTDA., e nota fiscal e reci análise, conforme lição da doutrina, consiste no emprego de documento falso como prova do fato de importância jurídica a que diz respeito, como se fosse verdadeiro1.
No caso dos autos, o réu assinou um suposto contrato de prestação de serviçoo, apresentou também a nota fiscal e os recibos de fls. 33/35 do apenso II ao Tribunal de Contas da União.
Exame documentoscópico procedido pelo ITCP/RN concluiu que a assinatura constante do aludido contrato não emanou do punho do sócio da emom a Prefeitura Municipal de Japi/RN. Referiu, na mesma oportunidade, que sua empresa, em verdade, sequer atuava no ramo da construção civil.
Consequentemente, não havendo qualquer contratação ou sequer tendo o Sr. Jorge Luiz conhecido qualqueim sendo, diante da eloqüência das provas produzidas pela acusação, a condenação do acusado pela prática do delito de uso de documento falso (art. 304, CP) é medida que se impõe. Registre-se, ainda, que em se tratando de documento público, a sanção a ser o de 2008, prescreve que deve constar da sentença condenatória a fixação do valor mínimo para a reparação dos danos causados pelo delito.
O nosso direito penal, seguindo a ótica dos Estados democráticos ou estruturados sob a forma dos ideais dida dentro dos padrões mínimos de harmonia. Dessa forma, toda conduta tipificada como ilícito criminal é, igualmente, um ilícito de ordem cível, de modo que, além da sanção penal, cabe a imposição do direito de reparação dos danos. Daí por que a presença o de um mesmo fato e da mesma causa de pedir, a busca de uma única solução para ambas as instâncias deve passar necessariamente pelo modelo processual para o qual sejam previstas menores restrições à prova e em que o grau de certeza a ser obtido na reconstordinante, na medida em que impede a reabertura da discussão em qualquer outro processo ou juízo, em homenagem à unidade de jurisdição3". Portanto, havendo sentença penal condenatória não é mais passível de discussão a existência do fato e a sua autoria n (C. Civil). A responsabilidade civil é independente da criminal, não se podendo questionar mais sobre a existência do fato, ou sobre quem seja o autor, quando estas questões se acharem decididas no juízo criminal.
Tal eficácia preclusiva sualém. O que era tratado pelo Código Penal como efeito lógico e genérico da condenação criminal (Obrigação de indenizar - an debeatur), agora é apresentado como verdadeira condenação indenizatória, de caráter civil, com a determinação legal da fixação pelo fixará valor mínimo para reparação dos danos causados pela infração, considerando os prejuízos sofridos pelo ofendido; (Redação dada pela Lei nº 11.719, de 2008).
O referido dispositivo, interpretado gramaticalmente, é de duvidosa constituc afronta aos princípios do Devido Processo Legal e do Contraditório plasmados nos incisos LIV e LV da Carta da República, verbis:
"LIV - ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal;
LV - aos litigantesda reparação mínima se enquadraria como "pedido implícito", isto é, gerado apenas do referido dispositivo legal, o que dispensaria a sua presença expressa na denúncia. É que qualquer "pedido implícito" tem como característica, essencial e necessária, a viam pedido certo e determinado o que representaria o conceito reparação mínima? O que é o mínimo reparatório? É o valor que o juiz da causa fixar? Democraticamente rejeito tal prerrogativa autoritária.
O novel dispositivo processual também tem valor mínimo para a reparação dos danos causados pelo delito, com uma defesa escorada na negativa de autoria? Como o acusado pode apresentar provas de que o prejuízo foi menor do que o alegado se está afirmando que não cometeu o crime?
Deve, p manifesta e inequívoca, militando a dúvida em favor de sua preservação; (b) quando, entre interpretações plausíveis e alternativas, exista alguma que permita compatibilizá-la com a Constituição5".
Dessa forma, verifico que é possível compatibor para reparação dos danos causados pela infração, considerando os prejuízos sofridos pelo ofendido, se na inicial acusatória constar pedido expresso nesse sentido, bem como a quantificação daqueles prejuízos materiais6 e se o contraditório cível não reprdido nesse sentido.
III - DISPOSITIVO
DIANTE DO EXPOSTO, julgo procedente em parte a pretensão punitiva deduzida pelo Ministério Público Federal, para CONDENAR o acusado TARCÍSIO ARAÚJO DE MEDEIROS pelo cometimentoiso III, do Decreto-lei nº 201/67:
CONSIDERANDO a culpabilidade normal à espécie; que o denunciado é primário e possui bons antecedentes; que, pelo que dos autos consta, a conduta do acusado é normal no meio social; que não há nos autos elem encontram relatadas nos autos, não havendo o que se valorar; que as conseqüências extrapenais do crime foram graves, uma vez que o objeto do referido convênio, de caráter eminentemente social, não foi regularmente cumprido; que a vítima, em sendo o Poder g, do CP, tendo em vista que o delito em questão contém como elementar ser o agente prefeito ou vereador), bem como a inexistência de causas de aumento e diminuição da pena, TORNO CONCRETA e DEFINITIVA a pena de 05 (cinco) meses de detenção.
al no meio social; que não existem nos autos elementos suficientes à aferição da personalidade do agente, razão pela qual deixo de valorá-la; que, pelo que se retira dos autos, não foram evidenciados motivos relevantes para a prática do ilícito; que as cirO A PENA-BASE no mínimo legal, ou seja, em 02 (dois) anos de reclusão.
CONSIDERANDO a incidência das agravantes previstas nas alíneas b e g do art. 61 do Código Penal, tendo em vista que o ilícito foi cometido para assegurar a ocultação e a imes, bem como a inexistência de causas de aumento e diminuição da pena, TORNO CONCRETA e DEFINITIVA a pena de 02 (dois) anos e 09 (nove) meses de reclusão.
CONDENO ainda o acusado, levando em conta as considerações esposadas acima, ao pagamentosujeita à correção monetária, devendo ser liquidada por cálculo da Contadoria do Juízo, extraindo-se, após o trânsito em julgado desta decisão, certidão da sentença para fins de execução do valor devido nos termos da Lei de Execução Fiscal (art. 51 do Códiigo Penal, somo as sanções aplicadas, tornando CONCRETA a PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE do acusado em 02 (DOIS) ANOS E 09 (NOVE) MESES DE RECLUSÃO e 05 (CINCO) MESES DE DETENÇÃO, e a PENA DE MULTA de 67 (SESSENTA E SETE) DIAS-MULTA.
As penas pris os requisitos do art. 44 do Código Penal pátrio, pois a pena aplicada não é superior a quatro anos; o crime não foi cometido com violência ou grave ameaça à pessoa; o réu é primário; e a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e a personalidade ido art. 44, § 2º, 2ª parte, quais sejam: uma prestação de serviços à comunidade (art. 43, inciso IV, do Código Penal), pelo período de 03 (três) anos e 02 (dois) meses, em entidade a ser fixada pelo Juízo da Execução, à razão de 01 (uma) hora de tarefa poS
Tratando-se de crime de responsabilidade previsto no Decreto-Lei nº 201/67, imponho ao condenado, como efeito automático da condenação, e após o trânsito em julgado da presente sentença, nos termos do art. 1º, § 2º, do referidoV, do CPP, por considerar que a fixação do valor mínimo exige prévio pedido nesse sentido.
Transitada em julgado a sentença, lance-se o nome do acusado TARCÍSIO ARAÚJO DE MEDEIROS no rol dos culpados e oficie-se ao TRE/RN, para os fins do art.Vara/RN
Registrada a r. sentença sob o n.º _______________________________ do Livro de Registro o ano de 2011.
Natal, _____ de ___________ de 2011.
1 JESUS, de Damásio. Direito Penal., 11ª edição, 2001, pág. 84
2 Curso de Processedição. 2004, pág. 188.
6 Baseado em artigo do Dr. Antônio Carlos Santoro Filho, Juiz de Direito de São Paulo.
---------------
PODER JUDICIÁRIO
JUSTIÇA FEDERAL DE PRIMEIRO GRAU
Seção Judiciária do Rio Grande do Norte
Segunda Vara